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Capítulo 65 — O
templo novamente purificado
Este capítulo é
baseado em Mateus 21:12-16, 23-46; Marcos 11:15-19, 27-33; 12:1-12; Lucas
19:45-48; 20:1-19.
No princípio de Seu
ministério, Cristo expulsara do templo os que o manchavam por seu profano
tráfico; e Sua atitude severa e divina enchera de terror o coração dos astutos
comerciantes. Ao fim de Sua missão, foi Ele outra vez ao templo e encontrou-o
de novo profanado como antes. As condições eram ainda piores. O pátio do templo
estava como um vasto curral de gado. Com os berros dos animais e o agudo tinir
das moedas, misturava-se o som de iradas altercações entre os traficantes, e
ouviam-se entre eles vozes de homens no sagrado ofício. Os dignitários do
templo empenhavam-se, eles próprios, em comprar e vender, e trocar dinheiro.
Tão completamente se achavam dominados pela cobiça de lucro que, aos olhos de Deus,
não eram melhores que ladrões.
Pouco percebiam os
sacerdotes e principais a solenidade da obra que lhes cumpria realizar. Em toda
páscoa e festa dos tabernáculos, milhares de animais eram mortos, e seu sangue
recolhido pelos sacerdotes e derramado sobre o altar. Os judeus
familiarizaram-se com a oferta de sangue e quase perderam de vista o fato de
ser o pecado o que tornava necessário todo esse derramamento de sangue de
animais. Não discerniam que isso prefigurava o sangue do querido Filho de Deus,
que seria derramado pela vida do mundo, e que pela oferta de sacrifícios deviam
os homens ser levados ao crucificado Redentor.
Jesus olhava as
inocentes vítimas do sacrifício, e via como os judeus haviam tornado essas
grandes convocações cenas de derramamento de sangue e de crueldade. Em lugar de
humilde arrependimento pelo pecado, multiplicaram o sacrifício de animais, como
se Deus pudesse ser honrado por um serviço destituído de coração. Os sacerdotes
e principais endureceram a alma pelo egoísmo e a avareza. Os próprios símbolos
que indicavam o Cordeiro de Deus, haviam eles transformado num meio de ganho.
Assim, aos olhos do povo fora destruída, em grande parte, a santidade do
serviço sacrifical. Despertou-se a indignação de Jesus; sabia que Seu sangue, tão
próximo a ser vertido pelos pecados do mundo, seria tão pouco apreciado pelos
sacerdotes e anciãos, como o dos animais, que derramavam incessantemente.
Contra tais práticas
falara Cristo por meio dos profetas. Dissera Samuel: “Tem porventura o Senhor
tanto prazer em holocaustos e sacrifícios, como em que se obedeça à Palavra do
Senhor? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender melhor é
do que a gordura de carneiros”. 1 Samuel 15:22. E Isaías, vendo em visão
profética a apostasia dos judeus, a eles se dirigiu como príncipes de Sodoma e
Gomorra: “Ouvi a Palavra do Senhor, príncipes de Sodoma; prestai ouvidos à lei
do nosso Deus, vós, ó povo de Gomorra. De que Me serve a Mim a multidão de
vossos sacrifícios, diz o Senhor? Já estou farto dos holocaustos de carneiros,
e de gordura de animais nédios; e não folgo com o sangue dos bezerros, nem de
cordeiros, nem de bodes. Quando vindes para comparecerdes diante de Mim, quem
requereu isto de vossas mãos, que viésseis pisar os Meus átrios?” “Lavai-vos,
purificai-vos, tirai a maldade de vossos atos de diante dos Meus olhos; cessai
de fazer mal; aprendei a fazer bem; praticai o que é reto; ajudai o oprimido;
fazei justiça ao órfão, tratai da causa das viúvas”. Isaías 1:10-12, 16, 17.
Aquele mesmo que
dera essas profecias, repetia agora, pela última vez, a advertência. Em
cumprimento da profecia, o povo proclamara Jesus rei de Israel. Ele lhes
recebera as homenagens, e aceitara a posição de rei. Nesse caráter devia agir.
Sabia que seriam nulos Seus esforços para reformar um sacerdócio corrompido;
não obstante, essa obra precisava ser feita; tinha de ser dada a um povo
incrédulo a prova de Sua divina missão.
Novamente o
penetrante olhar de Jesus percorreu o profanado pátio do templo. Todos os olhares
estavam voltados para Ele. Sacerdotes e principais, fariseus e gentios, olhavam
com surpresa e respeito para Aquele que Se achava diante deles com a majestade
do Rei do Céu. A divindade irrompeu da humanidade, revestindo Cristo de uma
dignidade e glória que jamais manifestara. Os que se achavam mais próximos dEle
afastaram-se o mais que lhes permitia a multidão. Não fosse a presença de
alguns de Seus discípulos, e o Salvador Se encontraria como isolado. Todos os
sons cessaram. Parecia insuportável o profundo silêncio. Cristo falou com um
poder que dominou o povo como uma forte tempestade: “Está escrito: A Minha casa
é casa de oração; mas vós fizestes dela covil de salteadores”. Lucas 19:46. Sua
voz soou como trombeta através do templo. O desagrado de Sua fisionomia
assemelhava-se a um fogo consumidor. Com autoridade, ordenou: “Tirai daqui
estes.”
Três anos antes, os
dirigentes do templo haviam-se envergonhado de sua fuga à ordem de Jesus.
Sempre se admiraram depois, de seus temores e de sua obediência sem réplica a
um simples, humilde homem. Julgaram ser impossível repetir-se a humilhante
submissão. Ficaram, todavia, ainda mais aterrados agora que antes e mais
apressados em obedecer-Lhe à ordem. Não houve ninguém que ousasse
questionar-Lhe a autoridade. Sacerdotes e comerciantes fugiram-Lhe da presença,
tangendo adiante o gado.
Ao saírem do templo,
encontraram no caminho uma multidão que trazia os enfermos, indagando pelo
grande Médico. As notícias dadas pelos que fugiam, fizeram com que alguns
desses voltassem atrás. Temiam encontrar Alguém tão poderoso, cujo simples
olhar afugentara de Sua presença os sacerdotes e principais. O maior número,
porém, avançou por entre a multidão apressada, ansiosos de encontrar Aquele que
era sua única esperança. Ao fugir do templo a multidão, muitos ficaram atrás. A
esses se reuniram então os recém-vindos. Novamente o pátio do templo se encheu
de doentes e moribundos, e mais uma vez, Jesus os socorreu.
Depois de algum
tempo, os sacerdotes e líderes se aventuraram a voltar ao templo. Acalmado o
pânico, sentiram-se presa de ansiedade quanto ao que iria Jesus fazer em
seguida. Esperavam que tomasse o trono de Davi. Voltando silenciosamente ao
templo, ouviram vozes de homens e mulheres e crianças louvando a Deus. Ao entrar,
ficaram paralisados diante da maravilhosa cena. Viram os enfermos curados, os
cegos restaurados à vista, os surdos ouvindo, e os coxos saltando de prazer. As
crianças superavam os demais no regozijo. Jesus lhes curara as moléstias;
enlaçara-as nos braços, recebera-lhes os beijos de reconhecido afeto, e algumas
delas haviam adormecido em Seu peito, ao ensinar Ele a multidão. Agora, com
alegres vozes, os pequenos Lhe entoavam o louvor. Repetiam os hosanas da
véspera, e triunfalmente agitavam palmas diante do Salvador. O templo ecoava e
reecoava às suas aclamações: “Bendito o que vem em nome do Senhor”! Salmos
118:26. “Eis que o teu Rei virá a ti, justo e Salvador!” Zacarias 9:9. “Hosana
ao Filho de Davi!”
O som dessas
felizes, irreprimidas vozes foi uma ofensa para os dirigentes do templo.
Decidiram-se a fazer calar essas demonstrações. Disseram ao povo que a casa de
Deus era profanada pelos pés das crianças e suas aclamações de júbilo.
Verificando que suas palavras não causavam impressão no povo, voltaram-se os
sacerdotes para Cristo: “Ouves o que estes dizem? E Jesus lhes disse: Sim;
nunca lestes: pela boca dos meninos e das criancinhas de peito tiraste o
perfeito louvor?” Mateus 21:16. Predissera a profecia que Cristo seria
proclamado rei, e essa palavra se devia cumprir. Os sacerdotes e principais de
Israel recusaram anunciar Sua glória, e Deus moveu as crianças para Lhe
servirem de testemunhas. Silenciassem as vozes infantis, e os próprios pilares
do templo entoariam o louvor do Salvador.
Os fariseus ficaram
inteiramente perplexos e desconcertados. Alguém que não podiam intimidar,
achava-Se com a direção. Jesus tomara Sua posição de guarda do templo. Nunca
antes assumira essa régia autoridade. Nunca antes haviam Suas palavras e ações
possuído tão grande poder. Fizera maravilhosas obras por toda Jerusalém, mas
nunca antes por maneira tão solene e impressiva. Em presença do povo que Lhe
testemunhara as maravilhosas obras, os sacerdotes e principais não ousavam
hostilizá-Lo abertamente. Conquanto zangados e confundidos por Sua resposta,
não foram capazes de fazer qualquer coisa mais naquele dia.
Na manhã seguinte, o
Sinédrio considerou novamente a atitude que devia tomar para com Jesus. Três
anos antes, tinham pedido um sinal de Sua messianidade. Desde então realizara
Ele poderosas obras por toda a Terra. Curara os enfermos, alimentara
miraculosamente milhares de pessoas, caminhara sobre as ondas, e Sua palavra
impusera calma ao revoltado mar. Repetidamente lera o coração dos homens como
um livro aberto; expulsara demônios e ressuscitara mortos. Os principais tinham
diante de si as provas de Sua messianidade. Decidiram então não pedir nenhum
sinal de Sua autoridade, mas tirar dEle qualquer confissão ou declaração que O
pudessem condenar.
Dirigindo-se ao
templo, onde Ele estava ensinando, puseram-se a interrogá-Lo: “Com que
autoridade fazes isto? e quem Te deu tal autoridade?” Mateus 21:23. Esperavam
que Ele declarasse proceder de Deus Sua autoridade. Essa afirmação intentavam
negar. Mas Jesus os enfrentou com outra interrogação, aparentemente ligada a
assunto diverso, e tornou Sua resposta dependente da que eles dessem a essa
pergunta. “O batismo de João”, disse Ele, “de onde era? Do Céu, ou dos homens?”
Mateus 21:25.
Viram os sacerdotes
encontrar-se diante de um dilema do qual nenhum sofisma os podia livrar. Se
dissessem que o batismo de João era do Céu, tornar-se-ia patente sua
incoerência. Cristo diria: Então por que não o crestes? João testificara de
Cristo: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. João 1:29. Se os
sacerdotes acreditassem no testemunho de João, como poderiam negar a
messianidade de Cristo? Se declarassem sua crença real, de que o ministério de
João era dos homens, trariam sobre si mesmos uma tempestade de indignação; pois
o povo acreditava que João era profeta.
Com vivo interesse
aguardava o povo a decisão. Sabia que os sacerdotes haviam professado aceitar o
ministério de João, e esperavam que reconhecessem indiscutivelmente que fora
enviado por Deus. Mas depois de conferenciarem em segredo entre si, decidiram
não se comprometer. Professando hipocritamente ignorância, disseram: “Não
sabemos.” “Nem Eu vos digo com que autoridade faço isto” (Mateus 21:27), disse
Jesus.
Escribas, sacerdotes
e principais ficaram todos em silêncio. Confundidos e decepcionados, quedaram
cabisbaixos, não ousando insistir em interrogar a Cristo. Por sua covardia e
indecisão haviam, em grande medida, perdido o respeito do povo, que se achava
então ao lado, divertido de ver derrotados esses orgulhosos homens, cheios de
justiça própria.
Todas essas palavras
e atos de Cristo eram importantes, e sua influência devia ser experimentada em
grau sempre crescente depois de Sua crucifixão e ascensão. Muitos dos que
tinham esperado ansiosamente o resultado da pergunta de Jesus, afinal se
tornariam discípulos Seus, havendo sido pela primeira vez atraídos a Ele naquele
dia cheio de acontecimentos. A cena do pátio do templo nunca mais se apagaria
da memória deles. Era assinalado o contraste entre Jesus e o sumo sacerdote,
quando juntos falavam. O orgulhoso dignitário do templo estava trajado de ricas
e custosas vestimentas. Tinha na cabeça uma brilhante tiara. Seu porte era
majestoso, os cabelos e a longa barba prateados pela idade. Sua aparência
enchia de respeito os que o viam. Perante essa augusta personagem, achava-Se a
Majestade do Céu, sem adorno ou ostentação. Tinha nas vestes os vestígios das
jornadas; Seu rosto era pálido e exprimia paciente tristeza; todavia, nEle se
estampavam dignidade e benevolência em estranho contraste com o ar orgulhoso,
presunçoso e irado do sumo sacerdote. Muitos dos que testemunhavam as palavras
e atos de Jesus no templo, entronizaram-nO daí em diante no coração como
profeta de Deus. À medida, porém, que o sentimento popular se voltava em favor
de Jesus, o ódio dos sacerdotes crescia para com Ele. A sabedoria com que Se
esquivava aos laços que Lhe armavam aos pés, sendo uma nova evidência de Sua
divindade, acrescentava combustível a sua ira.
Em Sua discussão com
os rabis, não era propósito de Cristo humilhar os oponentes. Não Se alegrava em
vê-los em situação difícil. Tinha importante lição a ensinar. Mortificara os
inimigos, permitindo que se vissem emaranhados na própria rede que para Ele
haviam preparado. Sua confessada ignorância com respeito ao caráter do batismo
de João, proporcionou-Lhe oportunidade de falar e aproveitou-a,
apresentando-lhes sua verdadeira situação e ajuntando uma advertência às muitas
que já fizera.
“Mas que vos
parece?” disse Ele. “Um homem tinha dois filhos, e, dirigindo-se ao primeiro,
disse: Filho, vai trabalhar hoje na minha vinha. Ele, porém, respondendo,
disse: Não quero. Mas depois, arrependendo-se, foi. E, dirigindo-se ao segundo,
falou-lhe de igual modo; e, respondendo ele, disse: Eu vou, senhor; e não foi.
Qual dos dois fez a vontade do pai?” Mateus 21:28-31.
Essa súbita pergunta
tirou Seus ouvintes de sua habitual posição de guarda. Haviam acompanhado
atentamente a parábola, e então responderam imediatamente: “O primeiro.” Fixando
neles o firme olhar, respondeu Jesus em tom severo e solene: “Em verdade vos
digo que os publicanos e as meretrizes entram diante de vós no reino de Deus.
Porque João veio a vós no caminho da justiça, e não o crestes, mas os
publicanos e as meretrizes o creram; vós, porém, vendo isto, nem depois vos
arrependestes para o crer”. Mateus 21:31, 32.
Os sacerdotes e
principais não podiam deixar de dar resposta correta à pergunta de Cristo, e
assim obteve Ele sua opinião em favor do primeiro filho. Este filho representava
os publicanos, os que eram desprezados e odiados pelos fariseus. Os publicanos
haviam sido inteiramente imorais. Tinham sido na verdade transgressores da lei
de Deus, mostrando em sua vida absoluta resistência às Suas reivindicações.
Eram ingratos e profanos; ao ser-lhes dito que fossem trabalhar na vinha do
Senhor, recusaram desdenhosamente. Mas ao vir João, pregando o arrependimento e
o batismo, os publicanos receberam a mensagem e foram batizados.
O segundo filho
representava os dirigentes da nação judaica.
Alguns fariseus se
tinham arrependido, recebendo o batismo de João; mas os dirigentes não quiseram
reconhecer que ele viera de Deus. Suas advertências e acusações não os levaram
a uma reforma. “Rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos, não tendo sido
batizados por ele.” Trataram desdenhosamente sua mensagem. Como o segundo filho
que, quando chamado, disse: “Eu vou, senhor”, mas não foi, os sacerdotes e
principais professaram obediência, mas agiram em sentido contrário. Faziam
grandes profissões de piedade, pretendiam estar obedecendo à lei divina, mas
prestavam apenas uma falsa obediência. Os publicanos eram acusados e
amaldiçoados pelos fariseus como incrédulos; mas mostraram por sua fé e obras
que iam para o reino do Céu antes daqueles homens cheios de justiça própria,
aos quais fora dada grande luz, mas cujas obras não correspondiam a sua
profissão de piedade.
Os sacerdotes e
principais não tinham vontade de suportar essas penetrantes verdades; ficaram
calados, entretanto, na esperança de que Jesus dissesse qualquer coisa que
pudessem voltar contra Ele; mas tinham de suportar ainda mais.
“Ouvi ainda outra
parábola”, disse Cristo. “Houve um homem, pai de família, que plantou uma
vinha, circundou-a de um valado, e construiu nela um lagar, e edificou uma
torre, e arrendou-a a uns lavradores, e ausentou-se para longe. E, chegando o
tempo dos frutos, enviou os seus servos aos lavradores, para receber os seus
frutos. E os lavradores, apoderando-se dos servos, feriram um, mataram outro, e
apedrejaram outro. Depois enviou outros servos, em maior número do que os
primeiros; e eles fizeram-lhes o mesmo; e, por último, enviou-lhes seu filho,
dizendo: Terão respeito ao meu filho. Mas os lavradores, vendo o filho,
disseram entre si: Este é o herdeiro; vinde, matemo-lo, e apoderemo-nos da sua
herança. E, lançando mão dele, o arrastaram para fora da vinha, e o mataram.
Quando pois vier o senhor da vinha, que fará àqueles lavradores?” Mateus
21:33-40.
Jesus Se dirigiu a
todo o povo presente; mas os sacerdotes e principais responderam. “Dará
afrontosa morte aos maus”, disseram, “e arrendará a vinha a outros lavradores,
que a seu tempo lhe deem os frutos”. Mateus 21:41. Os que assim falavam não
perceberam, a princípio, a aplicação da parábola, mas viram depois haver
proferido a própria condenação. Na parábola, o pai de família representava
Deus, a vinha a nação judaica, e o valado a lei divina que lhes servia de
proteção. A torre era um símbolo do templo. O dono da vinha fizera tudo que era
para prosperidade da mesma. “Que mais se podia fazer à Minha vinha”, diz Ele,
“que lhe não tenha feito?” Isaías 5:4. Assim foi representado o incessante
cuidado de Deus para com Israel. E como os lavradores deviam devolver ao pai de
família a devida proporção de frutos da vinha, assim o povo de Deus O devia
honrar por uma vida em correspondência com os sagrados privilégios que tinham.
Mas, como os lavradores mataram os servos que o senhor lhes enviara em busca de
frutos, assim os judeus fizeram morrer os profetas que Deus mandara para os
chamar ao arrependimento. Mensageiro após mensageiro fora morto. Até aí a
aplicação da parábola não podia ser posta em dúvida, e no que se seguiu não foi
menos clara. No amado filho a quem o senhor da vinha afinal mandara a seus
desobedientes servos, e de quem se apoderaram para matar, viram os sacerdotes e
principais uma distinta figura de Jesus e a sorte que sobre Ele impendia. Já
estavam planejando tirar a vida Àquele a quem o Pai lhes enviara em um último
apelo. Na retribuição infligida aos ingratos lavradores, estava descrita a
sorte dos que haviam de condenar Cristo à morte.
Olhando-os com
piedade, continuou o Salvador: “Nunca lestes nas Escrituras: A pedra, que os
edificadores rejeitaram, essa foi posta por cabeça do ângulo; pelo Senhor foi
feito isto, e é maravilhoso aos nossos olhos? Portanto Eu vos digo que o reino
de Deus vos será tirado, e será dado a uma nação que dê os seus frutos. E quem
cair sobre esta pedra despedaçar-se-á; e aquele sobre quem ela cair será reduzido
a pó”. Mateus 21:42-44.
Essa profecia
repetiram os judeus muitas vezes nas sinagogas, aplicando-a ao Messias que
havia de vir. Cristo era a pedra de esquina da dispensação judaica, e de todo o
plano da salvação. Essa pedra fundamental os edificadores judaicos, os
sacerdotes e príncipes de Israel, estavam agora rejeitando. O Salvador chamou-lhes
a atenção para as profecias que lhes mostrariam seu perigo. Buscou, por todos
os meios possíveis, mostrar-lhes claramente a natureza do ato que estavam para
praticar.
E Suas palavras
tinham outro desígnio. Ao fazer a pergunta:
“Quando, pois, vier
o senhor da vinha, que fará àqueles lavradores?” (Mateus 21:40) era intuito de
Cristo que os fariseus respondessem como fizeram. Tinha em vista que eles
mesmos se condenassem. Suas advertências, deixando de despertá-los para o
arrependimento, selar-lhes-iam a condenação, e Ele queria que vissem que eles
próprios haviam trazido sobre si a ruína. Intentava mostrar-lhes a justiça de
Deus em retirar-lhes os privilégios nacionais, o que já começara e terminaria,
não somente na destruição do templo e da cidade, mas na dispersão da nação.
Os ouvintes
reconheceram a advertência. Não obstante, porém, a sentença que eles mesmos
haviam proferido, os sacerdotes e príncipes estavam prontos a completar o
quadro, dizendo: “Este é o herdeiro; vinde, matemo-lo.” “E, pretendendo
prendê-Lo, recearam o povo” (Mateus 21:46), porque o sentimento público era a
favor de Cristo.
Citando a profecia
da pedra rejeitada, referia-Se Cristo a uma ocorrência verdadeira da história
de Israel. O incidente relacionava-se com a edificação do primeiro templo.
Conquanto tivesse especial aplicação ao tempo do primeiro advento de Cristo,
devendo ter tocado com poder especial aos judeus, encerra também uma lição para
nós. Ao ser erigido o templo de Salomão, as imensas pedras para as paredes e os
fundamentos foram inteiramente preparadas na pedreira; depois de serem levadas
para o local da construção, nenhum instrumento devia ser nelas empregado; os
obreiros só tinham que as colocar em posição. Fora trazida para ser empregada
nos fundamentos uma pedra de dimensões extraordinárias, e de singular feitio;
mas os construtores não conseguiam achar lugar para ela e não a queriam
aceitar. Era-lhes um estorvo, jazendo para ali, sem utilidade. Por muito tempo
assim ficou como pedra rejeitada. Mas, ao chegarem os edificadores à ocasião de
colocar a pedra angular, procuraram por muito tempo uma de tamanho e
resistência suficientes e do devido formato, para ocupar aquele lugar e
suportar o grande peso que sobre ela repousaria. Fizessem uma imprudente
escolha para esse importante lugar, e estaria em risco a segurança de todo o
edifício. Deveriam encontrar uma pedra capaz de resistir à influência do Sol,
da geada e da tempestade. Várias pedras foram escolhidas, diversas vezes, mas,
sob a pressão de imensos pesos, haviam-se despedaçado. Outras não puderam
suportar a prova das súbitas mudanças atmosféricas. Afinal, a atenção dos
construtores foi atraída para a pedra por tanto tempo rejeitada. Ficara exposta
ao ar, ao Sol e à tempestade, sem apresentar a mais leve fenda. Os edificadores
examinaram essa pedra. Suportara todas as provas, menos uma. Se pudesse
resistir à prova de vigorosa pressão, decidir-se-iam a aceitá-la para pedra
angular. Foi feita a prova. A pedra foi aceita, levada para o lugar que lhe era
designado, verificando-se a ele ajustar-se perfeitamente. Em profética visão,
foi mostrado a Isaías que essa pedra era um símbolo de Cristo. Diz ele:
“Ao Senhor dos
Exércitos, a Ele santificai; e seja Ele o vosso temor, e seja Ele o vosso
assombro. Então Ele vos será santuário; mas servirá de pedra de tropeço, e de
rocha de escândalo, às duas casas de Israel; de laço e rede aos moradores de
Jerusalém. E muitos dentre eles tropeçarão, e cairão, e serão quebrantados, e
enlaçados e presos”. Isaías 8:13-15. Levado em visão adiante, ao primeiro
advento, é mostrado ao profeta que Cristo devia sofrer provas e experiências
das quais era um símbolo o que se fizera à pedra de esquina do templo de
Salomão. “Portanto assim diz o Senhor Jeová: Eis que ponho em Sião uma pedra,
uma pedra já provada, pedra preciosa de esquina, que está bem firme e fundada;
aquele que crê não se apresse”. Isaías 28:16.
Com infinita
sabedoria, escolheu Deus a pedra fundamental, e a colocou Ele mesmo. Chamou-a
“firme”. O mundo inteiro pode depor sobre ela seus fardos e pesares; pode
suportá-los a todos. Com perfeita segurança podem edificar sobre ela. Cristo é
uma “pedra já provada”. Aqueles que nEle confiam, Ele nunca decepcionará.
Suportou todas as
provas. Resistiu à pressão da culpa de Adão e da de sua posteridade, e saiu
mais que vencedor dos poderes do mal. Tem suportado os fardos sobre Ele
lançados por todo pecador arrependido. Em Cristo tem encontrado alívio o
coração culpado. Ele é o firme fundamento. Todos quantos fazem dEle sua
confiança, descansam em segurança perfeita.
Na profecia de
Isaías, declara-se que Cristo é tanto o firme fundamento como uma pedra de
tropeço. O apóstolo Pedro, escrevendo sob inspiração do Espírito Santo, mostra
claramente para quem Cristo é uma pedra de esquina, e para quem é rocha de
escândalo:
“Se é que já
provastes que o Senhor é benigno: e, chegando-vos para Ele — pedra viva,
reprovada, na verdade pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa, vós,
também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo,
para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo. Pelo
que também na Escritura se contém: Eis que ponho em Sião a pedra principal da
esquina, eleita e preciosa; e quem nela crer não será confundido. E assim para
vós, os que crerdes, é preciosa, mas para os rebeldes, a pedra que os
edificadores reprovaram essa foi a principal da esquina; e uma pedra de tropeço
e rocha de escândalo, para aqueles que tropeçam na Palavra, sendo
desobedientes”. 1 Pedro 2:3-8.
Para os que creem,
Cristo é o firme fundamento. São eles que caem sobre a Rocha e se despedaçam. A
submissão a Cristo e a fé nEle são aqui representadas. Cair sobre a Rocha e despedaçar-se,
é renunciar a nossa própria justiça e ir a Cristo com a humildade de uma
criança, arrependidos de nossas transgressões e crendo em Seu amor perdoador. E
assim também é pela fé e a obediência que edificamos sobre Cristo como nosso
fundamento.
Sobre essa pedra
viva podem edificar semelhantemente judeus e gentios. Este é o único fundamento
sobre que podemos com segurança edificar. É suficientemente largo para todos, e
forte bastante para sustentar o peso e o fardo do mundo inteiro. E pela ligação
com Cristo, a pedra viva, todos quantos edificam sobre esse fundamento se
tornam pedras vivas. Muitas pessoas são lavradas, polidas e embelezadas por
seus próprios esforços; não podem, no entanto, tornar-se “pedras vivas”, porque
não estão ligadas a Cristo. Sem essa ligação, homem algum se pode salvar. Sem a
vida de Cristo em nós, não podemos resistir às tempestades das tentações. Nossa
segurança eterna depende de edificarmos sobre o firme fundamento. Multidões se
encontram hoje em dia edificando sobre fundamento não provado. Ao cair a chuva,
e soprarem os ventos, e as enchentes sobrevirem, sua casa cairá, porque não
está fundada sobre a Rocha eterna, a principal pedra de esquina — Cristo Jesus.
“Para aqueles que
tropeçam na Palavra, sendo desobedientes”, Cristo é uma rocha de escândalo. Mas
“a pedra que os edificadores rejeitaram, essa foi posta por cabeça do ângulo”.
Como a pedra rejeitada, Cristo, em Sua missão terrestre suportara desdém e maus-tratos.
Foi “desprezado, e o mais indigno dentre os homens; homem de dores, e
experimentado nos trabalhos: [...] era desprezado, e não fizemos dEle caso
algum”. Isaías 53:3. Mas aproximava-se o tempo em que Ele seria glorificado.
Pela ressurreição dentre os mortos, seria “declarado Filho de Deus em poder”. Romanos
1:4. Em Sua segunda vinda, seria revelado como Senhor do Céu e da Terra. Os que
se achavam então prestes a crucificá-Lo, reconheceriam Sua grandeza. Perante o
Universo, a pedra rejeitada Se tornaria a principal pedra de esquina.
“E aquele sobre quem
ela cair ficará reduzido a pó.” O povo que rejeitou a Cristo, teria de ver em
breve destruídas sua cidade e nação. Sua glória seria despedaçada, espalhada
como o pó diante do vento. E que foi que destruiu os judeus? Foi a rocha que,
houvessem eles edificado sobre ela, teria sido sua segurança. Foi a bondade
divina desprezada, a justiça maltratada, e menosprezada Sua misericórdia. Os
homens deliberaram opor-se a Deus, e tudo quanto teria servido para sua
salvação foi voltado para sua destruição. Tudo quanto Deus ordenara para vida,
acharam ser para morte. Na crucifixão de Cristo pelos judeus, estava envolvida
a destruição de Jerusalém. O sangue derramado sobre o Calvário, foi o peso que
os fez abismar na ruína para este mundo e o mundo por vir. Assim será no grande
dia final, quando o juízo cair sobre os que rejeitam a graça divina. Cristo,
para eles a pedra de escândalo, aparecer-lhes-á então como vingadora montanha.
A glória de Seu rosto, que para os justos é vida, será para os ímpios um fogo
consumidor. Por causa do amor rejeitado, da graça desprezada, será destruído o
pecador.
Mediante muitas
ilustrações e repetidas advertências, Jesus mostrou qual seria o resultado,
para os israelitas, de rejeitar o Filho de Deus. Nessas palavras, dirigia-Se a
todos, em todos os séculos, que se recusam a recebê-Lo como Redentor. Todas as
advertências são para eles. O templo profanado, o filho desobediente, os falsos
lavradores, os edificadores desdenhosos, têm seu paralelo na experiência de
todo pecador. A menos que este se arrependa, sobrevir-lhe-á a condenação
prefigurada por aqueles.
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