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Capítulo 21 —
Betesda e o Sinédrio
Este capítulo é
baseado em João 5.
Ora em Jerusalém há,
próximo à porta das ovelhas, um tanque, chamado em hebreu Betesda, o qual tem
cinco alpendres. Nestes jazia grande multidão de enfermos; cegos, mancos, e paralíticos,
esperando o movimento das águas”. João 5:2, 3. Em certo tempo as águas desse
tanque eram agitadas, e acreditava-se comumente que isso era o resultado de
poder sobrenatural, e que aquele que primeiro descesse a elas depois de haverem
sido movidas, ficaria curado de qualquer enfermidade que tivesse. Centenas de
sofredores afluíam ao local; tão grande, porém, era a multidão quando a água
era agitada, que todos se precipitavam para diante, atropelando homens, mulheres
e crianças mais fracos que eles. Muitos não se podiam aproximar do tanque.
Muitos dos que conseguiam até ali chegar, morriam à beira dele. Haviam-se
construído em torno do mesmo abrigos para proteção dos doentes contra o calor
do dia e frio da noite. Alguns havia que passavam a noite nesses alpendres,
arrastando-se para a beira do tanque dia a dia, numa vã esperança de cura.
Jesus Se achava de
novo em Jerusalém. Sozinho, em aparente meditação ou oração, chegou ao tanque.
Viu os míseros sofredores à espreita daquilo que julgavam sua única
oportunidade de cura. Ansiou exercer Seu poder restaurador, e curar cada um
daqueles enfermos. Mas era sábado. Multidões se dirigiam ao templo para o
culto, e Ele sabia que esse ato de cura havia de despertar por tal modo o
preconceito dos judeus que Lhe interromperiam a obra.
Mas o Salvador viu
um caso de suprema miséria. Tratava-se de um homem que fora paralítico por
trinta e oito anos. Sua enfermidade era, em grande parte, resultado de seu
próprio pecado, sendo considerada um juízo de Deus. Sozinho e sem amigos,
sentindo-se excluído da misericórdia de Deus, o enfermo passara longos anos de
miséria. Ao tempo em que se esperava o movimento das águas, os que se
compadeciam de seu desamparo o conduziam aos alpendres. No momento propício,
porém, ninguém havia que o ajudasse a entrar na água. Vira o movimento das
águas, mas nunca lhe fora possível chegar além da beira do tanque. Outros, mais
fortes que ele, imergiam primeiro. Não podia competir com a turba egoísta e
pronta a apoderar-se da vantagem. Seus persistentes esforços em direção desse
único objetivo, bem como a ansiedade e as contínuas decepções nesse sentido,
estavam-lhe consumindo rapidamente as restantes energias.
O enfermo jazia em
sua esteira, quando, dirigindo casualmente a fronte para olhar ao tanque, eis
que um terno e compassivo semblante se achava inclinado por sobre ele, e
prenderam-lhe a atenção as palavras: “Queres ficar são?” João 5:6. A esperança
brotou-lhe no coração. Sentiu que, de qualquer modo, ia ser ajudado. Em breve,
porém, desvaneceu-se-lhe o brilho de animação. Lembrou-se de quantas vezes
experimentara chegar ao tanque, e tinha agora pouca probabilidade de viver até
que a água fosse novamente agitada. Voltou-se fatigado, dizendo: “Senhor, não
tenho homem algum que, quando a água é agitada, me meta no tanque; mas,
enquanto eu vou, desce outro antes de mim”. João 5:7.
Jesus não pediu a
esse sofredor que tivesse fé nEle. Diz simplesmente: “Levanta-te, toma a tua
cama, e anda”. João 5:8. A fé do homem, todavia, apodera-se daquelas palavras.
Cada nervo e músculo vibra de nova vida, e a energia da saúde enche-lhe os
membros paralisados. Sem duvidar, determina-se a obedecer à ordem de Cristo, e
todos os músculos obedecem-lhe à vontade. Pondo-se repentinamente de pé,
sente-se um homem no exercício de suas atividades.
Jesus não lhe dera
nenhuma certeza de auxílio divino. O homem se podia haver detido a duvidar,
perdendo a única oportunidade de cura. Creu, porém, na Palavra de Cristo, e
agindo sobre ela, recebeu a força.
Por meio da mesma fé
podemos receber cura espiritual. Fomos, pelo pecado, separados da vida de Deus.
Temos a alma paralítica. Não somos, por nós mesmos, mais capazes de viver vida
santa, do que o era aquele homem de andar. Muitos há que compreendem a própria
impotência, e anseiam aquela vida espiritual que os porá em harmonia com Deus;
estão vãmente lutando por obtê-la. Em desespero, clamam: “Miserável homem que
eu sou! quem me livrará do corpo dessa morte!” Romanos 7:24. Que essas pessoas
acabrunhadas, lutadoras, olhem para cima. O Salvador inclina-Se sobre a
aquisição de Seu sangue, dizendo com inexprimível ternura e piedade: “Queres
ficar são?” Pede-vos que vos levanteis com saúde e paz. Não espereis sentir que
estais são. Crede-Lhe na Palavra, e será cumprida. Ponde a vontade do lado de
Cristo. Desejai servi-Lo e, agindo sobre Sua Palavra, recebereis força. Seja
qual for a má prática, a dominante paixão que, devido à longa condescendência,
acorrenta alma e corpo, Cristo é capaz de libertar, e anseia fazê-lo. Comunica
vida à pessoa morta em ofensas. Efésios 2:1. Porá em liberdade o cativo preso
pela fraqueza, o infortúnio e as cadeias do pecado.
O restabelecido
paralítico curvou-se para apanhar seu leito, que era apenas uma esteira e um
cobertor e, ao endireitar-se novamente com uma sensação de deleite, olhou em
volta à procura de seu Libertador; mas Jesus desaparecera entre a multidão. O
homem temeu não O reconhecer, se O tornasse a encontrar. Ao ir apressado o seu
caminho, com passo firme, desembaraçado, louvando a Deus e regozijando-se no
vigor que acabava de obter, encontrou vários dos fariseus, e contou-lhes
imediatamente sua cura. Surpreendeu-se da frieza com que lhe ouviam a história.
De sobrancelhas
carregadas, interromperam-no, perguntando-lhe por que estava conduzindo seu
leito no sábado. Lembraram-lhe severamente que não era lícito conduzir fardos
no dia do Senhor. Em sua alegria, o homem esquecera-se de que era sábado;
todavia não sentiu nenhuma condenação por obedecer ao mandado de uma Pessoa que
tinha poder de Deus. Respondeu ousadamente: “Aquele que me curou, Ele próprio
disse: Toma a tua cama, e anda”. João 5:11. Perguntaram quem havia feito isso,
mas o homem não lhes sabia dizer. Esses principais bem sabiam que unicamente Um
Se mostrara capaz de realizar esse milagre; mas queriam prova direta de que era
Jesus, a fim de O poderem condenar como violador do sábado. Em seu juízo, não
somente havia quebrado a lei em curar o enfermo no sábado, mas cometera
sacrilégio em lhe mandar que levasse a cama.
Por tal forma haviam
os judeus pervertido a lei, que a tornavam um jugo de servidão. Suas exigências
destituídas de significado eram um provérbio entre as outras nações.
Especialmente havia o sábado sido cercado de toda espécie de restrições
destituídas de senso. Não lhes era um deleite o santo dia do Senhor, digno de
honra. Os escribas e fariseus lhe tinham tornado a observância intolerável
fardo. Ao judeu não era permitido acender fogo, nem mesmo uma vela no sábado.
Consequentemente, o povo dependia dos gentios quanto a muitos serviços que seus
regulamentos proibiam que fizessem para si mesmos. Não refletiam que, se essas
ações eram pecaminosas, os que empregavam outros para as praticar eram tão
culpados como se as houvessem praticado eles próprios. Julgavam que a salvação
se restringia aos judeus, e sendo a condição dos outros já desesperada, não se
poderia tornar pior. Mas Deus não deu mandamentos que não possam ser obedecidos
por todos. Suas leis não sancionam quaisquer restrições irrazoáveis ou
egoístas.
Jesus encontrou no
templo o homem que fora curado. Este viera trazer uma oferta pelo pecado, e
também uma de ações de graças pela grande bênção recebida. Encontrando-o entre
os adoradores, Jesus deu-Se a conhecer, com a advertência: “Eis que já estás
são; não peques mais, para que não te aconteça alguma coisa pior”. João 5:14.
O enfermo restaurado
regozijou-se extremamente por encontrar seu Libertador. Ignorando a inimizade
que existia contra Jesus, disse aos fariseus que o haviam interrogado, que era
este O que o curara. “Por esta causa os judeus perseguiam a Jesus, e procuravam
matá-Lo porque fazia estas coisas no sábado”. João 5:16.
Jesus foi levado
perante o Sinédrio para responder à acusação de violador do sábado. Houvessem
os judeus sido a esse tempo uma [136] nação independente, e tal acusação lhes
teria servido ao desígnio de O condenar à morte. Sua sujeição aos romanos
impediu isso. Os judeus não tinham poder para infligir pena de morte, e as
acusações apresentadas contra Cristo não tinham peso num tribunal romano.
Outros objetivos existiam, entretanto, que esperavam conseguir. Não obstante
seus esforços para anular-Lhe a obra, Cristo estava adquirindo, mesmo em
Jerusalém, influência superior à deles próprios. Multidões que se não
interessavam nas arengas dos rabis, eram atraídas por Seus ensinos. Podiam-Lhe
compreender as palavras, e seu coração era aquecido e confortado. Ele falava de
Deus, não como de vingativo juiz, mas de um terno pai, e revelar Sua imagem
como refletida num espelho. Suas palavras eram como bálsamo para o espírito
magoado. Tanto pelas palavras como pelas obras de misericórdia, estava Ele
derribando o opressivo poder das velhas tradições e mandamentos de homens, e
apresentando o amor de Deus em sua inesgotável plenitude.
Numa das primeiras
profecias concernentes a Cristo, está escrito:
“O cetro não se
arredará de Judá, nem o legislador dentre seus pés, até que venha Siló; e a Ele
se congregarão os povos”. Gênesis 49:10. O povo se estava congregando a Cristo.
Os corações simpatizantes da multidão aceitavam lições de amor e beneficência,
ao invés das rígidas cerimônias exigidas pelos sacerdotes. Não se houvessem
sacerdotes e rabis interposto, e Seus ensinos teriam operado uma reforma tal
como nunca foi testemunhada pelo mundo. A fim de conservar o poder, no entanto,
determinaram esses guias derribar a influência de Jesus. Sua citação perante o
Sinédrio, e uma aberta condenação de Seus ensinos, contribuiriam para a
efetuação desse desígnio; pois o povo nutria ainda grande reverência por seus
guias religiosos. Quem quer que ousasse condenar as exigências dos rabinos, ou
tentasse aliviar os fardos postos por eles sobre o povo, era considerado
culpado, não somente de blasfêmia, mas de traição. Nisso baseavam os rabis sua
esperança de despertar suspeitas contra Cristo. Representavam-nO como
procurando subverter os costumes estabelecidos, causando assim divisão entre o
povo, e preparando o caminho para a completa subjugação dos romanos.
Mas os planos cuja
execução esses rabis estavam elaborando tão zelosamente, originaram-se em outro
conselho, que não o do Sinédrio. Depois de haver fracassado em seu desígnio de
vencer a Cristo no deserto, arregimentara Satanás suas forças para se Lhe opor
ao ministério, obstando, se possível Sua obra. Aquilo que não conseguira
realizar por esforço pessoal, direto, decidira efetuar por meio de estratégia.
Tão depressa se retirara do conflito no deserto, em concílio com os anjos seus
confederados amadureceu os planos para cegar ainda mais o espírito do povo
judeu, a fim de não reconhecerem seu Redentor. Planejou operar por meio de seus
agentes humanos do mundo religioso, imbuindo-os de sua própria inimizade contra
o Campeão da verdade. Levá-los-ia a rejeitar a Cristo e a tornar-Lhe a vida o
mais amarga possível, esperando desanimá-Lo em Sua missão. E os guias de Israel
tornaram-se os instrumentos de Satanás em combater o Salvador.
Jesus viera para
engrandecer a lei, e a tornar gloriosa. Isaías 42:21. Não haveria de lhe
diminuir a dignidade, mas exaltá-la. Diz a Escritura: “Não desfalecerá, nem Se
apressará, até que estabeleça na Terra o juízo”. Isaías 42:4. Ele viera para
libertar o sábado daquelas enfadonhas exigências que o haviam tornado uma
maldição em vez de bênção.
Por isso escolhera o
sábado para nele realizar a cura de Betesda. Poderia haver curado o enfermo
igualmente em qualquer outro dia da semana; ou simplesmente tê-lo curado, sem
lhe dizer que levasse a cama. Isto, porém, não Lhe teria proporcionado a
oportunidade que desejava. Um sábio desígnio guiava todos os atos de Cristo na
Terra. Tudo quanto fazia era em si mesmo importante, bem como na lição que
comunicava. Escolheu, entre os sofredores que se achavam junto ao tanque, o
pior caso, para aí exercer Seu poder de cura, e pediu ao homem que levasse a
cama através da cidade, a fim de publicar a grande obra de que fora objeto.
Isso daria lugar à questão do que era ou não era lícito fazer no sábado, e
abriria o caminho para Ele condenar as restrições dos judeus quanto ao dia do
Senhor, declarando vãs suas tradições.
Jesus lhes afirmou
que a obra de aliviar os aflitos estava em harmonia com a lei do sábado. Estava
em harmonia com os anjos de Deus que estão sempre descendo e subindo entre o
Céu e a Terra para servir à humanidade sofredora. Jesus declarou: “Meu Pai trabalha
até agora, e Eu trabalho também”. João 5:17. Todos os dias são de Deus, para
neles se executar Seus planos para com a raça humana. Fosse a interpretação dos
judeus razoável, então o Senhor estaria em falta, visto ser Seu trabalho que
vivifica e mantém toda criatura vivente desde que lançou os fundamentos da
Terra; então Aquele que declarou boa a sua obra, e instituiu o sábado para
comemorar-lhe o acabamento, deveria acabar com Seu labor e deter a incessante
rotina do Universo.
Deveria Deus impedir
o Sol de cumprir sua missão no sábado, obstar seus fecundos raios de aquecer a
Terra e nutrir a vegetação? Deveriam os sistemas planetários quedar imóveis
durante aquele santo dia? Ordenaria às fontes que se abstivessem de regar os
campos e as florestas, mandaria às ondas do mar que detivessem seu incessante
fluir e refluir? Deveriam o trigo e o milho deixar de crescer, e o maturante
cacho adiar seu belo colorido? Não hão de as árvores florescer, nem desabrochar
as flores no sábado?
Fora assim, e
deixariam os homens de ter os frutos da terra, e as bênçãos que tornam
desejável a vida. A natureza deve continuar seu invariável curso. Deus não
poderia por um momento deter Sua mão, do contrário o homem desfaleceria e viria
a morrer. E o homem também tem nesse dia uma obra a realizar. Devem-se atender
às necessidades da vida, cuidar dos doentes, suprir as faltas dos necessitados.
Não será tido por inocente o que negligenciar aliviar o sofrimento no sábado. O
santo dia de repouso de Deus foi feito para o homem, e os atos de misericórdia
se acham em perfeita harmonia com seu desígnio. Deus não deseja que Suas
criaturas sofram uma hora de dor que possa ser aliviada no sábado, ou noutro
dia qualquer.
As solicitações para
com Deus são ainda maiores no sábado do que nos outros dias. Seu povo deixa
então a ocupação ordinária, e passa mais tempo em meditação e culto. Pedem-Lhe
mais favores no sábado, que noutros dias. Exigem-Lhe a atenção de modo
especial. Anelam Suas mais preciosas bênçãos. Deus não espera que o sábado passe
para lhes conceder esses pedidos. A obra no Céu não cessa nunca, e o homem não
deve descansar de fazer o bem. O sábado não se destina a ser um período de
inútil inatividade. A lei proíbe trabalho secular no dia de repouso do Senhor;
o labor que constitui o ganha-pão, deve cessar; nenhum trabalho que vise prazer
ou proveito mundanos, é lícito nesse dia; mas como Deus cessou Seu labor de
criar e repousou ao sábado, e o abençoou, assim deve o homem deixar as
ocupações da vida diária, e devotar essas sagradas horas a um saudável repouso,
ao culto e a boas obras. O ato de Cristo em curar o enfermo estava de perfeito
acordo com a lei. Era uma obra que honrava o sábado.
Jesus afirmou ter
direitos iguais aos de Deus, ao fazer uma obra da mesma maneira sagrada, e do
mesmo caráter daquela em que Se empenhava o Pai no Céu. Mas os fariseus ficaram
ainda mais exasperados. Ele não somente quebrantara a lei, segundo seu modo de
ver, mas dizendo que “Deus era Seu próprio Pai”, declarara ser igual a Deus.
Toda a nação judaica
chamava a Deus seu Pai, de maneira que se não deveriam ter assim enfurecido se
Cristo Se colocara na mesma relação para com Ele. Mas acusaram-nO de blasfêmia,
mostrando que compreendiam fazer Ele essa reivindicação no mais alto sentido.
Esses adversários de
Cristo não tinham argumentos com que enfrentar as verdades que lhes fazia
penetrar na consciência. Não podiam senão citar seus costumes e tradições, e
estes pareciam fracos e nulos quando comparados com os argumentos que Jesus
tirava da Palavra de Deus e da vida natural! Houvessem os rabis experimentado
qualquer desejo de receber a luz, e se teriam convencido de que Cristo dizia a
verdade. Evitavam, porém, os pontos que apresentavam com referência ao sábado,
e procuraram incitar ódio contra Ele, por declarar ser igual a Deus. A fúria
dos líderes não conhecia limites. Não houvessem temido o povo, e os sacerdotes
e rabis teriam matado a Jesus ali mesmo. Mas o sentimento popular em Seu favor
era forte. Muitos reconheciam em Cristo o amigo que lhes curara as moléstias e
confortara as dores, e justificavam-nO em curar o doente de Betesda. De modo
que os guias se viram obrigados, de momento, a restringir seu ódio.
Jesus repeliu a
acusação de blasfêmia. Minha autoridade, disse, para fazer a obra de que Me
acusais, é o ser Eu o Filho de Deus, um com Ele em natureza, em vontade e em
desígnio. Em todas as Suas obras de criação e providência, Eu coopero com Deus.
O “Filho por Si mesmo não pode fazer coisa alguma, se o não vir fazer ao Pai.”
Os sacerdotes e rabis estavam repreendendo o Filho de Deus pela própria obra
para cuja realização fora enviado ao mundo. Por seus pecados, haviam-se
separado de Deus e estavam, em seu orgulho, agindo independentemente dEle.
Sentiam-se suficientes para tudo, e não percebiam a necessidade de mais alta
sabedoria para lhes dirigir os atos. Mas o Filho de Deus era submisso à vontade
de Seu Pai, e dependente de Seu poder. Tão plenamente vazio do próprio eu era Jesus,
que não elaborava planos para Si mesmo. Aceitava os que Deus fazia a Seu
respeito, e o Pai os desdobrava dia a dia. Assim devemos nós confiar em Deus,
para que nossa vida seja uma simples operação de Sua vontade.
Quando Moisés estava
para construir o santuário como lugar de habitação de Deus, recebeu instruções
para fazer tudo segundo o modelo que lhe fora mostrado no monte. Moisés era
todo zeloso para fazer a obra de Deus; os homens mais talentosos e hábeis lhe
estavam ao lado para realizar suas sugestões. No entanto, não devia fazer uma
campainha, uma romã, uma borla, uma franja, uma cortina ou qualquer vaso do
santuário, que não fosse segundo o modelo mostrado. Deus o chamara ao monte e
lhe revelara as coisas celestiais. O Senhor o cobrira com Sua glória, a fim de
que pudesse ver o modelo, e segundo ele foram feitas todas as coisas. Assim a
Israel, a quem desejava tornar Seu lugar de habitação, revelara Seu glorioso
ideal de caráter. O modelo lhes fora mostrado no monte, quando a lei havia sido
dada no Sinai, e o Senhor passara perante Moisés, proclamando: “Jeová, o Senhor,
Deus misericordioso e piedoso, tardio em iras e grande em beneficência e
verdade; que guarda a beneficência em milhares; que perdoa a iniquidade, e a
transgressão e o pecado”. Êxodo 34:6, 7.
Israel preferira
seus próprios caminhos. Não haviam edificado segundo o modelo; mas Cristo, o
verdadeiro templo para habitação de Deus, moldara cada detalhe de Sua vida
terrestre em harmonia com o ideal divino. Disse Ele: “Deleito-Me em fazer a Tua
vontade, ó Deus Meu; sim, a Tua lei está dentro do Meu coração”. Salmos 40:8.
Assim nosso caráter deve ser formado para “morada de Deus em Espírito”. Efésios
2:22. E cumpre-nos fazer “tudo conforme o modelo”, isto é, Aquele que “padeceu
por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as Suas pisadas”. 1 Pedro
2:21.
As palavras de
Cristo nos ensinam que nos devemos considerar inseparavelmente ligados a nosso
Pai celestial. Seja qual for nossa posição, dependemos de Deus, que enfeixa em
Suas mãos todos os destinos. Ele nos designou nossa obra, e nos dotou de faculdades
e meios para ela. Enquanto submetermos a vontade à Sua, e confiarmos em Sua
força e sabedoria, seremos guiados por caminhos seguros, para realizar a parte
que nos cabe em Seu grande plano. Aquele, porém, que confia em sua própria
sabedoria e poder, se está separando de Deus. Em vez de trabalhar em harmonia
com Cristo, cumpre o desígnio do inimigo de Deus e dos homens.
O Salvador
continuou: “Tudo quanto Ele faz, o Filho o faz igualmente. [...] Assim como o
Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles
que quer”. João 5:19, 21. Os saduceus afirmavam que não havia ressurreição do
corpo; mas Jesus lhes diz que uma das maiores obras de Seu Pai é ressuscitar os
mortos, e que Ele próprio possui poder de fazer a mesma obra.
“Vem a hora, e agora
é, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem
viverão”. João 5:25. Os fariseus acreditavam na ressurreição dos mortos. Cristo
declara que mesmo agora o poder que dá vida aos mortos se encontra entre eles,
e eles hão de testemunhar-lhe a manifestação. É esse mesmo poder de ressuscitar
que dá vida à pessoa morta “em ofensas e pecados”. Efésios 2:1. Esse espírito
de vida em Cristo Jesus, a “virtude da Sua ressurreição” (Filipenses 3:10),
liberta os homens “da lei do pecado e da morte”. Romanos 8:2. O domínio do mal
é despedaçado e, pela fé, a mente é guardada do pecado. Aquele que abre o
coração ao Espírito de Cristo, torna-se participante daquele grande poder que
lhe fará o corpo ressurgir do sepulcro.
O humilde Nazareno
afirma Sua real nobreza. Ergue-se acima da humanidade, atira de Si o disfarce
do pecado e da injúria, e revela-Se — o Honrado dos anjos, o Filho de Deus, Um
com o Criador do Universo. Seus ouvintes ficam fascinados. Homem algum já falou
palavras como as Suas, nem se portou com tão régia majestade. Seus discursos
são claros e positivos, declarando plenamente Sua missão, e o dever do mundo:
“O Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo; para que todos honrem o
Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que O enviou.
[...] Porque, como o Pai tem a vida em Si mesmo, assim deu também ao Filho ter
a vida em Si mesmo. E deu-Lhe o poder de exercer o juízo, porque é o Filho do
homem”. João 5:22-27.
Os sacerdotes e
principais haviam-se arvorado em juízes, para condenar a obra de Cristo, mas
Ele Se declarou juiz deles próprios, e de toda a Terra. O mundo foi confiado a
Cristo, e por Seu intermédio tem vindo toda bênção de Deus à raça caída. Era o
Redentor, tanto antes como depois da encarnação. Assim que existiu o pecado;
houve um Salvador. Ele tem dado luz e vida a todos, e em harmonia com a medida
da luz concedida, será cada um julgado. E aquele que tem comunicado a luz, que
tem acompanhado a alma com as mais ternas súplicas, buscando atraí-la do pecado
para a santidade, é ao mesmo tempo seu Advogado e Juiz. Desde o início do
grande conflito no Céu, Satanás tem mantido sua causa por meio de engano; e
Cristo tem trabalhado no sentido de lhe revelar as tramas, e derribar-lhe o poder.
É Aquele que Se tem oposto ao enganador e, no decorrer de todos os séculos, Se
tem empenhado por arrebatar os cativos de seu poder, que julgará cada pessoa.
E Deus “deu-Lhe
poder de exercer o juízo, porque é o Filho do homem”. Como Ele tenha provado as
próprias fezes do cálice da aflição e tentação humanas, e compreenda as
fragilidades e pecados dos homens; como tenha, em nosso favor, resistido
vitoriosamente às tentações de Satanás, e lidará justa e ternamente com as
pessoas para cuja salvação derramou o próprio sangue — o Filho do homem é
indicado para exercer o juízo.
A missão de Cristo,
porém, não era julgar, mas salvar. “Deus enviou o Seu Filho ao mundo, não para
que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por Ele”. João 3:17. E
perante o Sinédrio Jesus declarou: “Quem ouve a Minha Palavra, e crê nAquele
que Me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da
morte para a vida”. João 5:24.
Pedindo a Seus
ouvintes que não se maravilhassem, Cristo desenrolou diante deles, em visão
ainda mais ampla, o mistério do futuro: “Vem a hora”, disse, “em que todos os
que estão nos sepulcros ouvirão a Sua voz. E os que fizeram o bem sairão para a
ressurreição da vida; e os que fizeram o mal para a ressurreição da
condenação”. João 5:28, 29.
Essa certeza da vida
futura era a que Israel há tanto aguardara, e esperava receber por ocasião do
advento do Messias. Sobre eles estava a resplandecer a única luz que pode
iluminar as sombras da sepultura. A obstinação, porém, é cega. Jesus violara as
tradições dos judeus, e desprezara-lhes a autoridade, e eles não queriam crer.
O tempo, o local, a
ocasião, a intensidade dos sentimentos que animavam a assembleia, tudo se
combinou para tornar mais impressivas as palavras de Jesus perante o Sinédrio.
As mais altas autoridades religiosas da nação estavam procurando tirar a vida
Àquele que Se declarava o restaurador de Israel. O Senhor do sábado era citado
perante um tribunal terrestre, para responder à acusação de quebrantar a lei
sabática. Ao declarar Ele tão intrepidamente Sua missão, Seus juízes
contemplaram-nO espantados e enfurecidos; Suas palavras, todavia, eram
irrespondíveis. Não O podiam condenar. Recusava aos sacerdotes e rabis o
direito de interrogar acerca de Sua obra, ou nela interferir. Não estavam
revestidos dessa autoridade. Suas pretensões baseavam-se no próprio orgulho e
arrogância. Ele Se recusava a reconhecer-Se culpado de suas acusações, ou ser
catequizado por ele.
Em lugar de Se
desculpar do ato de que se queixavam, ou explicar o próprio desígnio em assim
fazer, Jesus Se voltou contra os líderes, e o acusado tornou-Se acusador.
Repreendeu-os pela sua dureza de coração e ignorância das Escrituras. Declarou
que tinham rejeitado a Palavra de Deus, da mesma maneira que o haviam feito
Àquele a quem Deus enviara. “Examinais as Escrituras, porque vós cuidais ter
nelas a vida eterna, e são elas que de Mim testificam”. João 5:39. Em toda
página, seja história, preceito ou profecia, irradia nas Escrituras do Antigo
Testamento a glória do Filho de Deus. Em tudo quanto encerrava de instituição
divina, todo o judaísmo era uma encadeada profecia do evangelho. De Cristo “dão
testemunho todos os profetas”. Atos dos Apóstolos 10:43. Desde a promessa feita
a Adão, descendo pela linha patriarcal e a dispensação legal, a gloriosa luz
celeste tornou claras as pegadas do Redentor. Os viventes contemplaram a
Estrela de Belém, o Siló por vir, ao passarem diante deles, em misteriosa
procissão, os acontecimentos futuros. Em cada sacrifício, mostrava-se a morte
de Cristo. Em cada nuvem de incenso, ascendia Sua justiça. Seu nome ressoava
com cada trombeta de jubileu. No tremendo mistério do santo dos santos habitava
Sua glória.
Os judeus estavam de
posse das Escrituras, e supunham que, no mero conhecimento que delas possuíam,
tinham a vida eterna. Jesus, porém, disse: “A Sua Palavra não permanece em
vós”. João 5:38. Havendo rejeitado a Cristo em Sua Palavra, rejeitaram-nO em
pessoa. “Não quereis vir a Mim”, disse Ele, “para terdes vida”. João 5:40.
Os guias judaicos
tinham estudado os ensinos dos profetas a respeito do reino do Messias;
haviam-no feito, porém, não com o sincero desejo de conhecer a verdade, mas com
o desígnio de encontrar provas para apoiar suas ambiciosas esperanças. Vindo
Cristo de maneira contrária a sua expectativa, não O quiseram receber; e para
se justificarem, procuravam demonstrar que era enganador. Uma vez postos os pés
nesse caminho, fácil era a Satanás fortalecer-lhes a oposição a Cristo. As
próprias palavras que deveriam ter sido recebidas como testemunho de Sua
divindade, foram contra Ele interpretadas. Assim tornaram a verdade de Deus em
mentira, e quanto mais diretamente lhes falava o Salvador em Suas obras de
misericórdia, tanto mais decididos ficavam para resistir à luz.
Jesus disse: “Eu não
recebo glória dos homens”. João 5:41. Não era a influência do Sinédrio, não era
sua sanção que Ele desejava. Não podia receber honra alguma da aprovação deles.
Achava-Se revestido de honra e autoridade do Céu. Houvesse-a Ele desejado, e
anjos Lhe teriam vindo render homenagem; o Pai teria outra vez testificado de
Sua divindade. Mas, por amor deles próprios, por amor da nação que
representavam, desejava que os guias judaicos Lhe distinguissem o caráter, e
recebessem as bênçãos que lhes viera trazer.
“Eu vim em nome de
Meu Pai, e não Me aceitais; se outro vier em seu próprio nome, a esse
aceitareis”. João 5:43. Jesus veio pela autoridade de Deus, apresentando-Lhe a
imagem, cumprindo Sua Palavra e buscando-Lhe a glória; todavia, não foi aceito
pelos guias de Israel; mas quando outros viessem, assumindo o caráter de
Cristo, embora movidos por sua própria vontade e buscando a própria glória,
estes seriam recebidos. E por quê? — Porque o que busca a própria glória, fala
ao desejo de exaltação própria nos outros. A tais estímulos, corresponderiam os
judeus. Receberiam o falso mestre, porque lhes lisonjearia o orgulho pela
sanção de suas acariciadas opiniões e tradições. Os ensinos de Cristo, porém,
não tinham afinidades com suas ideias. Eram espirituais e exigiam o sacrifício
do eu; não O receberiam, portanto. Não estavam relacionados com Deus, e Sua
voz, por intermédio de Cristo, era para eles a de um estranho.
Não se repete o
mesmo em nossos dias? Não há muitos, mesmo guias religiosos, que estão endurecendo
o coração contra o Espírito Santo, tornando impossível a si mesmos o reconhecer
a voz de Deus? Não estão rejeitando a Palavra de Deus, a fim de conservar as
próprias tradições?
“Se vós crêsseis em
Moisés”, disse Jesus, “creríeis em Mim; porque de Mim escreveu ele. Mas, se não
credes nos seus escritos, como crereis nas Minhas palavras?” João 5:46. Fora
Cristo que falara a Israel por meio de Moisés. Houvessem eles ouvido a voz divina
que falara por intermédio de seu grande guia, e a teriam reconhecido nos
ensinos de Cristo. Houvessem crido em Moisés, e teriam acreditado nAquele de
quem ele escrevera.
Jesus sabia que os
sacerdotes e rabis estavam decididos a tirar-Lhe a vida; todavia, expôs-lhes
claramente Sua unidade com o Pai, e Sua relação para com o Mundo. Viram que a
oposição que Lhe moviam não tinha desculpa; todavia, seu ódio assassino não se
extinguiu. Deles se apoderou o temor ao testemunhar o convincente poder que Lhe
acompanhava o ministério, mas resistiram a Seus apelos, encerrando-se em
trevas.
Fracassaram
assinaladamente em derribar a autoridade de Jesus ou dEle alienar o respeito e
a atenção do povo, do qual muitos ficaram convencidos por Suas palavras. Os
próprios líderes se haviam sentido sob profunda condenação ao apresentar-lhes à
consciência sua culpa; todavia, isso apenas os instigou mais amargamente contra
Ele. Estavam decididos a tirar-Lhe a vida. Enviaram por todo o país mensageiros
a advertir o povo contra Jesus, como impostor. Mandaram-se espias para O
observar e relatar o que dizia ou fazia. O precioso Salvador achava-Se agora,
sem dúvida nenhuma, sob a sombra da cruz.
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